Adriana Ventura
Piso da enfermagem é sustentável?
Artigo sobre piso da enfermagem

Por um piso salarial sustentável

Qualidades morais, bons serviços, capacidade, eficiência… Esses são alguns dos requisitos que tornam um profissional digno de apreço e valorização. Mas não bastam elogios ou menções honrosas nos quadros de funcionário do mês: remuneração é sempre importante para balizar o mérito. Especialmente em tempos tão difíceis, de carestia e inflação, merecer o “prêmio em dinheiro” será sempre o desejo de dez entre dez profissionais brasileiros.

Sim, fala-se aqui de merecer, verbo atrelado a vários conteúdos como “ser digno de”, “ganhar”, e outros mais. Daí que após anos de lutas massacrantes, que incluem muitas vezes risco de vida, o merecimento do piso salarial da enfermagem ganha relevância única. A pretensão salarial de quem trabalhou na enfermagem ao longo da pandemia é moralmente obrigatória. Ou como negar respeito a quem continua a lutar na frente da batalha contra a assassina Covid-19?

Recentemente, em 14 de julho de 2022, foi promulgada a emenda constitucional nº 124/2022 que dá competência para a lei estabelecer o piso salarial de enfermeiro, técnico e auxiliar de enfermagem e parteira. A aprovação dessa PEC pelo Congresso Nacional permitiu, juridicamente, a sanção do PL 2564/2020. Agora, segundo a Lei já sancionada, os enfermeiros ganharão R$ 4.750,00 por mês, estejam eles ativos na capital de São Paulo ou em uma pequena vila do interior do Pará. Para ser honrado Brasil afora, estima-se que o novo piso irá custar mais de R$ 16 bilhões por ano, dos quais R$ 5,8 bilhões apenas para o setor público. São mais de 2,6 milhões de trabalhadores em atividade nos diversos segmentos da categoria segundo o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). 

A questão capital aqui não é o merecimento. É: quem vai pagar essa conta?

Frédéric Bastiat, economista e filósofo francês do século 19, defende a ideia de ser imperioso considerar os impactos a longo prazo de uma decisão (“o que não se vê”) e não apenas os efeitos visíveis (“o que se vê”), sob pena de a decisão provocar o que se pretendia evitar. Isso posto, vejamos: 1. Cada unidade da Federação tem uma capacidade orçamentária que precisa ser respeitada para não violar o Pacto Federativo, fazendo-se inexequível; 2. Não há fonte real de recursos para pagar o piso salarial em discussão; por isso, é de se presumir que governadores e prefeitos aumentem impostos, enquanto hospitais privados façam cortes de pessoal (enfermeiros), optando por mão de obra mais barata (técnicos de enfermagem) ao passo que instituições filantrópicas (Santas Casas) correm risco de fechar as portas, elas que já enfrentam sérios problemas financeiros; 3. Em consequência, os serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) serão ameaçados, afetando a vida da maioria dos brasileiros.

Reportagem do Valor Econômico do dia 25 de agosto, sobre dados da Associação Nacional dos Hospitais Privados, Confederação das Santas Casas e Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica, aponta que a adoção do piso nacional da enfermagem, sem a contrapartida de fonte de financiamento, levará à demissão de 83 mil empregados da área da enfermagem e ao fechamento de 20 mil leitos de hospitais filantrópicos e privados. 

O Partido Novo defende uma discussão ampla e não acelerada, feita a caráter para ganhar votos às vésperas de uma eleição, sobre o modo sustentável de valorizar não apenas a categoria da enfermagem, mas sim a saúde como um todo.

A enfermagem merece respeito, merece valorização, jamais ilusão.

Vem falar comigo!